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22 Set 2021
Faixa 18: Belkis Ayón
Vista das obras de Belkis Ayón na 34ª Bienal de São Paulo. © Levi Fanan /Fundação Bienal de São Paulo
Vista das obras de Belkis Ayón na 34ª Bienal de São Paulo. © Levi Fanan /Fundação Bienal de São Paulo

bienal · 17 - Belkis Ayón

Agora chegamos às obras de Belkis Ayón. Ela nasceu em 1967 em Havana, Cuba, onde faleceu aos 32 anos. Sua produção orbita em torno da presença de um segredo que é mantido oculto por diversos signos de silêncio e escuridão. 

Ela estudou no Instituto Superior de Arte de Havana entre 1986 e 91, onde se familiarizou com a calcografia, uma técnica de gravura em que a matriz de impressão resulta da colagem de diversos materiais sobre um suporte rígido. 

As matrizes de calcografia de Belkis Ayón são feitas de uma variedade de materiais: papelão, lixa, diferentes qualidades de papel, gesso e verniz; todos eles colados com metilcelulose em um papelão. A colagem de todos esses materiais torna a matriz tão forte que pode ser fixada diretamente nas paredes sem nenhum suporte ou moldura. 

Ainda na faculdade, ela também pesquisou a sociedade secreta afrocubana Abakuá, que influenciou profundamente sua produção. Os fundamentos do Abakuá datam do período colonial, e muitos de seus rituais só são conhecidos por iniciados – que, aliás, só podem ser do gênero masculino.

Nesta Bienal, temos 18 obras expostas, mas vamos nos aprofundar na que retrata a entidade Sikán. A obra tem dois metros de altura por um metro e quarenta de largura. Belkis Ayón interessou-se pelo modo como essa entidade, recorrente em sua produção, condensa noções de sacrifício, tabu, segredo e traição. A matriz de calcografia de que falamos aqui foi feita em 1991 e tem diversos dos recursos que a artista associa a essa mitologia em geral e a essa personagem em particular.

Na obra, Sikán é representada sentada em um trono preto. Sua cabeça, num tom de cinza um pouco mais claro que o do trono, não tem cabelos. Seus grandes olhos amendoados estão muito abertos e são a única marca expressiva em seu rosto, que não tem boca, nariz ou orelhas. A pele do seu corpo tem o que parecem ser escamas avermelhadas nos ombros e nas pernas, enquanto seus braços e tronco têm uma coloração vinho. Ela está com as duas mãos nas coxas e, em uma parte acinzentada de sua barriga, há um pequeno peixe branco. Uma serpente branca, sem nenhum detalhe, se apoia no encosto da poltrona e no ombro de Sikán. A paisagem ao fundo do trono tem uma coloração marrom clara e nela se veem grafismos na forma da letra “W”, que remetem às águas de um rio. Sobre toda imagem há uma arco adornado da mesma cor marrom clara do fundo e nele há um peixe branco com escamas.

Muitas são as versões da história de Sikán. Ela sempre começa sendo apresentada como uma princesa que, ao buscar água no rio, inadvertidamente capturou Tanzé, o peixe encantado que garantia a prosperidade de seu povo. O que aconteceu depois é narrado de formas bastante variadas, mas todas elas têm algo em comum: esse acaso resultou na morte do peixe e na perda de seu som divino. Em algumas versões, Sikán teria sido vista como alguém que absorveu seu poder; em outras, ela contou seu segredo a um amante de outra etnia, sendo então aprisionada e sacrificada por seu próprio povo. Há, porém, uma versão ainda mais dramática, que foi registrada pela antropóloga e poeta Lydia Cabrera em um texto de 1969. Ela diz: “a verdadeira dona do Poder era uma mulher que os homens mataram para apoderar-se de seu Segredo”.