Você já se perguntou se um mesmo objeto mantém seu significado quando exibido em contextos diferentes?
Para a curadoria da 34ª Bienal, a circunstância em que vemos uma obra de arte, ou qualquer outra coisa, influencia as leituras que fazemos dela. A cada novo encontro, diferentes aspectos dessa mesma obra podem ganhar mais ou menos relevância dependendo de tudo aquilo que a cerca e até mesmo do nosso estado de espírito no dia.
A obra Deposição, do brasileiro Daniel de Paula com o duo estadunidense Marissa Lee Benedict e David Rueter, parte de um objeto que foi retirado do seu lugar usual. Trata-se de uma arquibancada montada com cinco partes que se juntam lado a lado, formando uma arena. Essa estrutura tem aproximadamente cinco metros de largura com sete degraus concêntricos. Os degraus partem do centro, vão aumentando sua dimensão na largura e subindo até chegar ao topo. Em volta do sétimo degrau, o último e mais alto, há um gradil de proteção feito com barras de ferro. Em frente ao lado aberto dessa arena temos outra pequena arquibancada, formada desta vez por duas partes de conjuntos de sete degraus, trazendo a sensação de que foi deslocada da estrutura maior. Mais afastada destas duas arquibancadas, há mais uma parte que poderia fazer parte do conjunto, mas que se encontra na vertical.
Mas o que é essa arquibancada? Não é qualquer estrutura. Aliás, é algo que perdeu seu lugar no tempo, uma coisa deposta de status de objeto útil no mundo dos negócios: ela foi feita com as tábuas de madeira do piso do “Chicago Board of Trade”. Ou seja, é um antigo trading pit, ou roda de negociações, da bolsa de valores de Chicago.
E é na Bolsa de Chicago que o valor dos grãos do mundo inteiro são definidos. Assim, o que acontece ali tem relação direta com questões que envolvem desde o agronegócio brasileiro até a preservação da Amazônia, temas importantes para os artistas. Por isso eles se interessaram pelo símbolo do tablado.
Primeiro, o trio pretendia reproduzir a peça, mas quando descobriram que os "pits" estavam sendo descartados como parte da passagem definitiva da Bolsa às transações digitais, começou uma corrida contra o tempo para que eles pudessem resgatar o último que ainda restava. Pois é, a imagem de vários homens juntos gritando ao telefone, tão reproduzida pelo cinema e presente no nosso imaginário, agora é basicamente coisa do passado.
Em Deposição, temos, então, um objeto que deixa seu universo original e que, quando colocado em uma exposição de arte, passa a ser percebido de outro modo.
Mas não pense que a proposta aqui é assimilar a arquibancada com um valor museológico, ou de preservação de patrimônio histórico. A partir da apropriação dos artistas, essa estrutura, que promovia trocas que tinham por centro o dinheiro, é subvertida em seu uso e significado. Na 34ª Bienal, a antiga arena de negócios se tornou o espaço onde acontece a programação pública da mostra e uma área que também pode ser livremente ocupada pelos visitantes – inclusive você.